Cerca de 5 milhões de mulheres já declaram ter realizado
aborto no Brasil, ou seja, uma em cada sete mulheres. Hoje são executados
mundialmente 20 milhões de abortos, desses, 97% são feitos em países pobres ou
em desenvolvimento, onde a prática abortiva é criminalizada. Isso leva a uma
simples conclusão: o aborto existe, e os estudos históricos comprovam que essa
prática, apesar de clandestina sempre marcou a vida das mulheres por ser a
única alternativa frente a uma gravidez indesejada. Mulheres em condições
financeiras privilegiadas optam pela interrupção da gravidez por meio de
clínicas particulares que dispõem de profissionais preparados e procedimento
seguro. Já as mulheres da classe trabalhadora, em sua maioria negras, são
vitimas do sistema capitalista e de um estado que se declara laico, mas que
destinam como única alternativa a adesão de procedimentos inseguros que colocam
em cheque sua saúde e vida. O aborto clandestino é responsável por 602
internações diárias causadas por infecção, 25% de casos de esterilidade e 9% de
óbitos maternos, o que corresponde a terceira maior causa de morte materna, no
país. Não obstante, as que sobrevivem, correm o risco de serem presas, posto
que a prática é um crime, segundo o código penal brasileiro (de 1940). Outro dado
estatístico que deve ser pontuado é que uma em cada cinco mulheres com a faixa
etária de 40 anos já provocou o interrompimento da gravidez. Isso revela que
mais de 5 milhões de mulheres entre 18 e 39 anos já abortaram. A maioria delas
abortam com métodos inseguros e acabam finalizando o aborto nos hospitais
públicos. Portanto, o aborto é uma questão de saúde pública no Brasil e de
direitos fundamentais das mulheres. A discussão sobre o aborto no Brasil tem
sido pautada pelo poder público brasileiro como moeda de troca para angariar
votos, em particular das comunidades evangélicas e católicas, haja vista como o
tema foi tratado nas últimas eleições presidenciais. Isso revelou que o Estado
brasileiro não discute o aborto e a saúde da mulher, mas a possibilidade das
plataformas religiosas regularem ou não a reprodução das mulheres. Um claro
indicativo da força das religiões cristãs no espaço público, o que revela a
fragilidade do Estado diante do poder das religiões, salientando que o Brasil é
um país constitucionalmente laico. A opinião individual sobre a questão do
aborto não pode e não deve ser colocada em questão. O que deve ser levado para
a discussão é como o Estado pensa em cuidar desses milhões de mulheres que
chegam aos hospitais públicos para finalizar um aborto e quais políticas a
serem adotadas para amparar as mulheres que não desejam levar uma gravidez até
o fim, uma vez que é um mito dizer que a mulher nasceu para ser mãe, trata-se
de uma construção histórico-cultural.
Morgana Damásio
Rose Cerqueira